Filme de estreia de Jiri Menzel, Trens estreitamente vigiados foi lançado em 1966, nos primórdios da efervescência política e cultural que tomava conta da Checoslováquia. Dois anos depois, sonho de Alexander Dubcek de conferir “um rosto humano ao socialismo” foi esmagado pelos tanques do Pacto de Varsóvia, sob o comando russo. O filme ganhou o prêmio de melhor filme estrangeiro neste ano (1968).
O filme, no entanto, não retrata esse período. Faz um recuo na história, ao final da Segunda Guerra Mundial, quando o país estava ocupado pelas tropas nazistas. Baseado no romance escrito por Bohumil Hrabal, Trens estreitamente vigiados conta a história de Milos, jovem que segue as pegadas do pai ao se tornar aprendiz de sinaleiro na estação ferroviária da pequena cidade natal. Uma profissão prestigiada, como a mãe o lembra enquanto o ajuda a vestir o uniforme para se apresentar ao primeiro dia de trabalho.
Há várias razões para conferir à obra uma dimensão para além de seu tempo histórico, tornando-a atual e perene. Segundo a crítica, “o filme poderia passar tranquilamente como uma divertida e descompromissada comédia adolescente, mas consegue ir além, se tornando uma peça de registro histórico, um drama pessoal permeado por crítica política, misturando o pesado ar da guerra com as desventuras de um jovem que não sabia lidar com sua fragilidade ante a figura feminina e tinha dúvidas acerca de seu papel no complexo jogo da guerra”.
O dia a dia do trabalho, especialmente o convívio com colega, Hubicka (Josef Somr), experiente e sedutor, expõe as diferenças entre dois. Hubicka compensa a monotonia e o tédio das noites arrastadas com aventuras amorosas cada vez mais ousadas. Numa delas, carimba o traseiro da jovem que acabara de possuir, para a indignação da mãe que o denuncia e exige reparação. O ingênuo Milos troca beijos inocentes com a namorada, nas breves paradas do trem em que ela trabalha. Marcam encontro no estúdio fotográfico, onde jovens sorridentes divertem-se fazendo pose na cabine do avião pintado no painel, enquanto eles despistam o velho fotógrafo para transar num local mais discreto, uma das cenas mais hilárias do filme e que acaba em frustração, com a ejaculação precoce de Milos.
Sem resposta para o problema que o agonia, tenta o suicídio num quarto do bordel. Aconselhado pelo médico a procurar uma mulher mais experiente, encontra finalmente aquela que o trata com carinho, uma cena terna e carregada de simbologia. Com a autoconfiança recuperada, o jovem engaja-se no movimento cuja verdadeiro risco e dimensão política desconhece. A realidade da guerra é escancarada com a visita do oficial nazista que expõe a significado do recuo das tropas alemãs e deixa instruções precisas. Os trens transportando soldados e munições devem ter prioridade absoluta. Devem ser estreitamente vigiados. Milos é escolhido pela resistência para sabotar sua passagem, um pouco além da estação. A explosão estremece o chão, espalha uma nuvem de fumaça e a ventania fustiga a aldeia na emblemática cena final. Sela o destino de Milos como herói anônimo.
Ficha técnica
Filme: Trens estreitamente vigiados
Ano de lançamento: 1966
Direção: Jiri Manzel
Elenco: Václav Neckár, Josef Somr e Vlastimil Borosky
Premiação: Oscar de Melhor Filme Estrangeiro e Globo de Ouro em 1968.
Onde ver: Site AdoroCinema
O filme foi incluído na lista “1001 filmes que você deve ver antes de morrer” feita por Steven Schneider.