Semana de 24 a 31 de março/2024
O Conselho de Segurança das Nações Unidas finalmente aprovou uma resolução que demanda o cessar-fogo imediato na guerra entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza, que deve se estender durante todo o Ramadã, de 11 de março a 9 de abril. A resolução recebeu o apoio de 14 dos 15 membros do órgão —os Estados Unidos se abstiveram. O gesto americano rompe com a postura que o país vinha adotando ao usar o poder de veto para blindar Tel Aviv e representa uma escalada da tensão na relação entre Binyamin Netanyahu e Joe Biden, segundo avaliação na mídia.
Os principais fatos no plano internacional com repercussão no cenário nacional foram a visita do presidente francês, Emmanuel Macron, ao Brasil, a elevação do tom da crítica do Itamaraty ao descumprimento das regras democráticas nas eleições na Venezuela, endossadas por Lula, e a permanência de Bolsonaro na embaixada da Hungria por dois dias, após ter o passaporte cassado.
Na passagem de Macron pela Amazônia, os governos do Brasil e França anunciaram um programa de € 1 bilhão para a região, com recursos públicos e privados pelos próximos 4 anos e ênfase na bioeconomia. Os investimentos serão para o lado brasileiro e para o lado guianense. Segundo a nota conjunta, o programa terá 5 pontos: diálogo entre as administrações francesa e brasileira sobre os desafios da bioeconomia; parceria técnica e financeira entre bancos públicos brasileiros, incluindo o Basa e o BNDES, e a Agência Francesa de Desenvolvimento, presente no Brasil e na Guiana Francesa; nomeação de coordenadores especiais para as empresas francesas e brasileiras mais inovadoras no campo da bioeconomia; novo acordo científico entre a França e o Brasil, operado pelo Cirad e pela Embrapa; criação de um hub de pesquisa, investimento e compartilhamento de tecnologias-chave para a bioeconomia.
Outro marco importante da visita foi o lançamento ao mar do Submarino Tonelero, embarcação fabricada inteiramente no Brasil que integra o Programa de Desenvolvimento de Submarinos (ProSub), resultado da parceria estratégica entre Brasil e França, firmada em 2008, cujo orçamento gira em torno de R$ 40 bilhões. A visita do presidente francês desdobrou-se em encontros com empresários em São Paulo e encontros com o Lula em Brasília, onde os presidentes assinaram o novo plano de ação da parceria estratégica Brasil-França comemorada como resultado de mais de 100 anos de relações diplomáticas entre os dois países
Macron aproveitou a oportunidade para reafirmar críticas ao acordo EU-Mercosul. Segundo ele o atual acordo está sendo negociado há mais de 20 anos e não foi atualizado, para incluir, por exemplo, temas como o clima. Para ele, o acordo “precisa ser renegociado do zero”. A visita teve repercussão positiva na mídia internacional.
O pequeno atrito diplomático e sem consequências graves com a Venzuela teve origem na crítica do chanceler venezuelano ao comunicado do Ministério das Relações Exteriores do Brasil expressando preocupações sobre o processo eleitoral no país vizinho, dado ao impedimento à participação da candidata da oposição. O comunicado do Itamaraty foi considerado “”cinzento e intervencionista”, sugerindo que possivelmente teria sido “ditado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos”. Depois de Lula ter endossado o comunicado, posição considerada correta por sinalizar a não aceitação da quebra do pacto celebrado entre os dois países em defesa da democracia – acordos de Barbados -, a chancelaria da Venezuela resolveu abaixar o tom para evitar atrito com o presidente brasileiro.
A patética tentativa de Bolsonaro se refugiar na embaixada da Hungria, depois de ter o passaporte apreendido, foi objeto de crítica na mídia internacional e de pilhéria nas redes sociais, além de ter revelado como age a direita internacional em socorro a aliados. O governo recebeu com estarrecimento a notícia revelada pelo jornal The New York Times. Segundo matéria divulgada na imprensa, “a avaliação é que o embaixador da Hungria não recebeu apenas um adversário político da atual gestão, mas uma pessoa alvo de investigações no STF (Supremo Tribunal Federal). O gesto, dizem esses auxiliares, tem sido lido como uma interferência do governo da Hungria, liderado por Viktor Orbán, em assuntos internos do Brasil.”
O embaixador húngaro foi convocado pelo Itamaraty para prestar esclarecimentos. Ao buscar asilo na embaixada da Hungria, Bolsonaro busca a solidariedade de Viktor Orbán, ao mesmo tempo em que fundamenta o pedido de asilo no suposto fato de ser vítima de perseguição política. Para a operação funcionar basta que o outro lado esteja de acordo com a narrativa, mesmo que não seja verdadeira. O que não seria difícil de acontecer, tratando-se de um dos expoentes da ultradireita internacional.
Chegou-se a afirmar que Moraes está com a faca e o queijo na mão e que a prisão de Bolsonaro seria iminente, situação que deixou as hostes bolsonaristas em pânico. No entanto, setores do governo avaliam “que uma prisão de Bolsonaro neste momento é juridicamente frágil e poderia render munição para o discurso do ex-presidente de que ele é uma vítima de perseguição política”, divulgou a CNN Brasil.
O governo Lula continua tendo bons resultados na economia, como a criação de mais de 300 mil empregos formais em fevereiro. Indicadores recentes mostram a economia brasileira menos dependente do pagamento do Bolsa Família do que no início de 2023. Mas a percepção da população em relação à economia continua sendo negativa. De acordo pesquisa divulgada na semana, “há mais brasileiros considerando que a economia brasileira piorou nos últimos meses do que os que enxergam melhora. Aumentou também a taxa daqueles que veem mais inflação e desemprego à frente —e cresceu o total dos que acham que sua situação econômica pessoal piorou”.
Golpistas, por sua vez, têm debatido nos bastidores a conveniência e o momento ideal para pedir a anulação da delação premiada de Cid, alegando que foi pressionado pela PF a dar informações falsas durante os interrogatórios. Recorrerão à manobra enquanto também postulam a anistia aos envolvidos no fracassado golpe. Vão na contramão da vontade popular. Pesquisa recente do DataFolha indica que “63% dos brasileiros se opõem à ideia de conceder anistia aos envolvidos nos ataques de cunho golpista ocorridos em 8 de janeiro de 2023. Os dados evidenciam uma forte resistência por parte da população em perdoar os responsáveis pelos atos que abalaram a estabilidade democrática do país.”
Embora as investigações tenham avançado bastante, elas seguem o trâmite legal. Apesar de Bolsonaro ter cometido tantos crimes, ainda não foi indiciado em nenhum deles. Se isso demorar muito a ocorrer, há o risco de prevalecer a sensação de impunidade que levaria ao descrédito entre setores que apoiam a luta em defesa da democracia. Ao mesmo tempo, poderá aumentar, entre as hostes da direita golpista, o sentimento de que a demonstrada capacidade de mobilização e de comunicação nas redes sociais os blinda do alcance da Justiça.