As notícias divulgadas na mídia na semana de 16 a 22 de agosto continuaram desfavoráveis a Bolsonaro, indicando um processo crescente de deterioração do seu governo. Após dois anos e meio de mandato, os indicadores pioram em quase todas as áreas. O país assistiu ao retrocesso na economia, no social, meio ambiente, saúde e educação, entre outros setores. Dados divulgados pelo Banco Mundial revelam que a renda per capta dos brasileiros recuou, passando a ser inferior à de países de economia menos pujante da América do Sul, como Argentina, Chile e Uruguai. O dólar está em 5,38 e já subiu 39% desde o início do governo. A inflação continua fora de controle, superando o índice da meta para o ano; o preço do botijão de gás de cozinha teve seis reajustes este ano, chegando a R$93,32% em agosto, a título de exemplo. O desemprego continua em torno de 14% e é crescente o número de famílias em condição de insegurança alimentar.
Os dados negativos geram um cenário de incerteza e insegurança que, segundo analistas, se expressa na tendência de alta dos juros futuros para os próximos anos, projeção que chegou a atingir dois dígitos nesta semana, recuperando patamares de três anos atrás.
Insatisfeitos com o desempenho da economia, setores do mercado sinalizam que estão perdendo a paciência e ameaçam desembarcar da base de apoio ao governo. Pesam nesta decisão, além das medidas econômicas erráticas – calote nos precatórios – a crise política gerada pelo presidente, que tem colocado em descrédito o processo eleitoral e confrontado ministros do Supremo Tribunal Federal.
Outras notícias mostraram a pressão e o cerco ao governo, vindos de outras áreas. Carmen Lucia cobrou de Aras, o escudeiro do capitão, uma ação mais veemente contra os ataques do presidente às eleições. Questionado de todos os lados, inclusive dentro PGR, e enfrentando resistência no Senado para ser reconduzido ao cargo, Aras resolveu mostrar serviço e autorizou a ação de PF de busca e apreensão em endereços daqueles que incitam o levante contra o Supremo, como o cantor Sérgio Reis e o deputado federal Otoni de Paula (PSC/RJ).
Como reflexo do processo de desgaste que vem se dando ao longo do ano, em que pesam ainda a avaliação negativa da forma como o governo vem enfrentando a pandemia, o descaso com a população que demanda proteção social, as frequentes crises institucionais provocadas pelo presidente, pesquisas recentes mostram um quadro muito desfavorável ao Planalto: aumentou para 58% os que aprovam o impeachment de Bolsonaro e a rejeição ao governo atingiu o recorde de 64%.
Agravando esse quadro, os depoimentos na CPI da Covid tornaram a situação de Bolsonaro ainda mais embaraçosa. O auditor Alexandre Figueiredo Costa Marques, do TCU (Tribunal de Contas da União), confirmou que o seu trabalho apontando supernotificação no número de mortes pela Covid-19 foi alterado após ser encaminhado ao presidente Jair Bolsonaro, o que pode configurar mais um crime. O representante da Precisa Medicamentos, o advogado Túlio Silveira, optou por ficar em silêncio na maioria dos questionamentos feitos pelos senadores. O silêncio pode ser interpretado como declaração culpa diante de perguntas precisas, que conheciam a origem, o significado e o rastro do crime, como o comprovaram vários documentos apresentados por membros da comissão apontado fraudes na contratação de compra de vacinas. Após a sessão desta quarta-feira (18), ele se tornou investigado formal da comissão, assim como o deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara.
Foi neste contexto que Bolsonaro decidiu retesar ainda mais a corda e entrou com pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes no Senado. O gesto desesperado, ao tentar incriminar o membro do Supremo que o persegue, reafirma os papéis de algoz e vítima que procura incutir no imaginário coletivo, transformando em via crucis a trajetória do mito e agora mártir rumo às eleições de 2022.
Senadores já haviam dito que não iriam transformar a casa em circo do capitão. A reação da sociedade civil veio em profusão. O STJ (Superior Tribunal de Justiça), magistrados e procuradores condenaram a iniciativa. O presidente da OAB, reagiu na mesma linha. Em nota, os membros do Supremo foram enfáticos ao repudiar a ação: “Neste momento em que as instituições brasileiras buscam meios para manter a higidez da democracia (…) o Supremo repudia o ato do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, de oferecer denúncia contra um de seus integrantes por conta de decisões em inquérito chancelado pelo Plenário da Corte”.
O presidente do Senado, afirmara que o Congresso não iria aceitar “retrocessos” e que realizaria uma “vigorosa vigilância” da democracia. De forma sigilosa, havia também afirmado que não daria prosseguimento a pedidos de impeachment contra ministros do Supremo. Foi levado a uma declaração mais contundente na sexta-feira: “Não vamos nos render a nenhum tipo de investida para desunir o país. Gostaria que a energia que está sendo gasta para criar polêmicas fosse usada para resolver problemas”. Afirmou ainda que que o impeachment de um ministro da Suprema Corte “é algo grave, excepcional, de exceção, que não pode ser banalizado. (…) A avaliação é política, mas é também jurídica, é técnica”.
Ou seja, assistimos na última semana a mais um capítulo da novela absurda em que se transformou o governo Bolsonaro.