Na segunda, dia 14, enquanto o governo Putin emitia sinais de uma solução diplomática para o conflito na Ucrânia, o governo Biden sinalizou no sentido contrário, removendo sua embaixada de Kiev para Lviv, no oeste do país. No meio da semana que especialistas chegaram a considerar decisiva, a tensão aumentou, com expulsão por parte da Rússia do número 2 da embaixada dos EUA em Moscou, Bart Gorman. Três semanas depois de os EUA terem rejeitado o pacote de demandas do governo russo para estabilizar a segurança no Leste Europeu, Putin afirmou na quinta (17) que poderia tomar medidas “técnico-militares”. Os norte-americanos refirmaram que a invasão era iminente, algo a acontecer nos próximos dias ou nos primeiros dias da próxima semana, segundo o próprio Biden, embora no linguajar militar a expressão usada por Putin seja interpretada pela OTAN como medidas agressivas, não necessariamente invasão militar.
Foi neste cenário de escalada da tensão que Bolsonaro aportou em Moscou, depositou flores no memorial aos soldados russos tombados na II Guerra Mundial, submeteu-se a todo o ritual medidas preventivas ao contágio da Covid para poder encontrar-se com Putin, a quem manifestou solidariedade à Rússia. A manifestação foi severamente criticada pelo governo norte-americano, como afirmou um porta-voz do Departamento de Estado: “O momento em que o presidente do Brasil se solidarizou com a Rússia, quando as forças russas se preparam para lançar ataques a cidades ucranianas, não poderia ter sido pior”.
No caminho de volta para casa, Bolsonaro aproveitou para fazer uma escala de última hora em Budapeste para apertar as mãos do presidente Órban, um dos expoentes internacionais da direita nacionalista, a quem o brasileiro chamou de “irmão”, por compartilhar o mesmo ideário “iliberal”. A expressão foi cunhada pelo presidente húngaro para denominar regimes que se dizem democráticos, que não seguem à risca a cartilha neoliberal, não respeitam a liberdade de expressão, nem eleições livres, mas apregoam valores tradicionais. Bolsonaro trouxe na bagagem deste périplo, em cuja comitiva os militares sobrepujaram em número os diplomatas, acordos de cooperação na área de segurança e declarações de intenção de conteúdo nebuloso. Trouxe também fotos com “aliados internacionais” para se rivalizar com Lula na campanha eleitoral.
As declarações de Lula na semana passada, por ocasião da celebração do aniversário de fundação do PT – Nós fomos criados para falar por aqueles que não tinham nem vez e nem voz, nós nascemos para defender os direitos da classe trabalhadora, nós nascemos para tentar provar ao mundo que era possível construir um país mais justo socialmente, mais humano, mais democrático – continuaram reverberando no cenário político. Lula continua em larga vantagem na disputa eleitoral, amplia as relações no centro do espectro político e acumula apoio de setores que se opuseram ao PT e à candidatura Haddad em 2018. Continua enfrentando dificuldades na consolidação das alianças no campo da esquerda, particularmente com o PSB, que não abre mão facilmente de pretensões eleitorais em 2022 e em 2024, quando estarão em disputa as administrações municipais. Um jogo de paciência e de boa negociação, qualidades que não faltam a Lula.
A novidade no cenário eleitoral é a provável candidatura de Eduardo Leite-PSDB, governador do Rio Grande do Sul, à presidência, desta vez pelo PSD. Notícias divulgadas na mídia afirmam estarem avançadas as conversas entre Kassab, presidente do PSD, e Leite. A candidatura, se confirmada, mexe no tabuleiro, impactando alianças e palanques em São Paulo, por exemplo. Colocada em cena, embaralha, ainda mais, a “terceira via”. A conferir.
A atribuição de mais poderes a Ciro Nogueira, inclusive para dar a última palavra em eventuais disputas envolvendo órgãos do governo, fragiliza ainda mais Guedes e confirma o crescente poder do centrão, que governa, de fato. Na busca por reforçar bases de apoio, Bolsonaro começou a liberar emendas parlamentares e apresentou o projeto de lei para legalizar o “garimpo artesanal”, eufemismo para liberar o garimpo ilegal e a devastação do meio ambiente. Na outra ponta, a lembrar o significado da destruição da política ambiental no governo Bolsonaro, assistimos na última semana a mais um evento climático extremo, desta vez atingindo Petrópolis, tragédia que assombrou o Brasil e o mundo.