“O desaparecimento de Dom e Bruno é apenas a mais recente violência na Amazônia aprisionada neste país a que chamamos Brasil, governado por um defensor da ditadura, da execução e da tortura chamado Jair Bolsonaro. Estamos em guerra. E afirmar isso não é retórica. (…) Não é incompetência ou descaso. É método. ” Eliane Brum |
A eleição de Gustavo Petro – ex-guerrilheiro, economista e ex-prefeito de Bogotá – à presidência da Colômbia, e de sua vice, Francia Marques, negra e advogada, foi o grande destaque da semana na América do Sul. Sua candidatura representou o desdobramento das manifestações populares que chacoalharam a Colômbia no ano passado pela coragem e ímpeto dos manifestantes que enfrentaram a peito nu as balas das forças da repressão. Seu programa de governo, de forte tom ambiental, visa uma mudança estrutural na economia.
Sua vitória pode significar um basta à extrema violência dos grandes proprietários de terra no meio rural, que vitimou centenas de lideranças camponesas, e uma eventual guinada da política de submissão aos interesses norte-americanos que transformaram a Colômbia numa espécie de enclave. Fortalece também uma possível retomada do projeto político de soberania e unidade dos países do continente (Unasul), impulsionado por governos de esquerda. Os novos ocupantes do Palácio de Nariño, no entanto, contam com apenas um terço de base de apoio no Congresso, o que tornará difícil executar o plano de governo e atender às demandas populares por maior inclusão social, vez e voz para os povos indígenas, mais acesso à educação e saúde de melhor qualidade, impostos menos abusivos para os pobres e mais impostos para os ricos.
O fortalecimento da esquerda na França, segunda força no recém-eleito Legislativo, limitará o poder de Macron em relação à agenda neoliberal. Terá que fazer concessões, além de enfrentar a ultradireita que também saiu fortalecida no pleito. Continuam impactando o cenário político norte-americano os resultados das investigações do Comitê criado no Congresso para apurar o envolvimento do ex-presidente Trump na invasão do Capitólio. Desta vez, apresentaram detalhes das pressões sobre seu vice, Mike Pence, para contestar a vitória de Biden.
Numa guerra que tende a se tornar longa, líderes da Alemanha, Itália e França encontraram-se com Zelensky em Kiev. Segundo Macron, foram levar “Uma mensagem de unidade europeia para o povo ucraniano; de apoio, para falar tanto do presente como do futuro, porque as próximas semanas, como sabemos, serão semanas muito difíceis”. Putin não deixou por menos: reduziu o fornecimento de gás para a Alemanha.
A prisão dos assassinos do jornalista inglês Dom Phillips e do indigenista brasileiro, Bruno Ribeiro, e a confissão dos detalhes de sua morte brutal chocaram o mundo. Novamente, ficou evidente a absoluta falta de empatia de Bolsonaro com os familiares das vítimas. Sua ação deliberada e sistemática de desmonte da política ambiental, de esvaziamento da Funai, ocupada por número crescente de militares, assim como a lentidão em tomar medidas para investigar o desaparecimento de Dom e Bruno o tornam conivente com o crime e com a ação predatória de quadrilhas de pescadores, madeireiros e mineradores que invadiram as reservas indígenas. Não se trata de um caso isolado, nem de um crime localizado. Nem de incompetência e descaso, como aponta uma respeitada jornalista: “É método”.
A repercussão internacional do crime, segundo analista, “projetou uma reputação seriamente negativa da realidade nacional –com problemas de violência, impunidade, desrespeito aos direitos humanos e descaso do governo federal com a proteção da floresta, dos povos indígenas e dos jornalistas. ” Somado ao crescente desmatamento da Amazônia, o impacto do assassinato colocará o Brasil diante de crescentes pressões, a começar pelo ingresso na OCDE: “O avanço da criminalidade na floresta amazônica e em outros biomas contrasta com as 21 metas verdes firmadas pelo país para pleitear o ingresso na OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), um dos principais objetivos do ministro Paulo Guedes (Economia). O plano inclui banir o desmatamento até 2030 e zerar a emissão de gases estufa até 2050. ”
Na semana em que o Congresso aprovou o teto para a cobrança de ICMS sobre combustíveis, medida inócua para conter a elevação do preço do diesel e da gasolina – mas que diminuirá recursos para políticas públicas como educação e saúde – o governo Bolsonaro se viu às voltas de uma guerra declarada contra a Petrobras. Juntou-se à Câmara para ameaçar com a abertura de uma CPI e para exigir a renúncia do presidente da empresa. Não convenceu. A Petrobras anunciou novo aumento dos preços, os caminhoneiros, que ameaçam com uma greve, afirmaram: “O governo se acomodou e por ironia do destino o ministro apelidado de posto Ipiranga, que deveria resolver esse problema, é o grande culpado deste caos, e hoje chegamos neste ponto crítico, sendo que ainda temos sérios riscos de falta de combustível (…) Muitos especialistas afirmam que esse problema tem soluções viáveis, mas está claro que essa não é a prioridade, o que vemos é um governo desesperado. ”
O desacerto na economia está sendo o calcanhar de Aquiles de Bolsonaro, seu ponto frágil na disputa eleitoral. O Copom anunciou mais uma elevação da taxa Selic, para a satisfação da banca e rentistas. Dados divulgados na semana mostram que a inflação da cesta básica atingiu 27% em doze meses e que cerca de 23 milhões de brasileiros vivem com menos de R$7,00 por dia. Um cenário aterrador de miséria.
Com pesquisa indicando que Lula se mantém no limite de vencer no primeiro turno, ajustes estão sendo feitos no seu plano de governo, com ênfase na questão econômica. Como seguro morreu de velho, foi oportuna a notícia divulgada na mídia de que “organizações e ativistas que já trabalham com a previsão de que o presidente Jair Bolsonaro (PL) executará um plano golpista nas eleições tentam articular uma reação orquestrada à ameaça de ruptura democrática e convencer mais setores sobre a urgência de mobilização”.