Semana de 13 a 19 de agosto/2023
“Três detonações abriram ontem uma cratera sob os pés de Bolsonaro e selaram seu destino como futuro presidiário: as acusações do hacker Walter Delgatti na CPMI do 8 de janeiro, a anunciada confissão Mauro Cid, que cumpriu ordens do ex-chefe para vender joias e lhe entregar o dinheiro, e a autorização do ministro Alexandre de Morais para a quebra dos sigilos bancário e fiscal dele e de Michelle.” As afirmações da jornalista Tereza Cruvinel, publicadas no Brasil247, resumem o significado político dos fatos ocorridos na quinta-feira da semana passada, dia que chegou a ser apontado como possível turning point para o destino político do ex-presidente e, no seu desdobramento, para aqueles que participaram da sua aventura golpista.
As acusações do hacker na CPMI, confirmadas em depoimento à PF e consideradas extremamente graves, giram em torno de três questões e envolvem, além de Bolsonaro, militares com quem o hacker teria se encontrado no Ministério da Defesa: o ex-presidente planejou forjar a invasão de uma urna eletrônica durante as celebrações do 7 de setembro de 2022, menos de 1 mês antes da eleição; Bolsonaro teria pedido para ele assumir a autoria de um grampo de conversas de Alexandre de Moraes, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal); o ex-presidente teria lhe prometido um indulto para que ele tentasse fraudar as urnas eletrônicas e colocar em dúvida a lisura das eleições. Ele teria se reunido com Bolsonaro no Palácio do Alvorada e, posteriormente, ido ao Ministério da Defesa para tratar de termos técnicos. Passado o primeiro impacto da notícia, delineia-se um longo caminho para que as denúncias sejam apuradas e seu resultado venha a engrossar o rol de provas dos crimes cometidos pelo ex-presidente contra as instituições democráticas.
O anúncio feito pelo novo advogado de Mauro Cid de que ele iria confessar que vendera as joias nos Estados Unidos, a mando de Bolsonaro, foi visto como intenção de entregar o jogo e apontar o mandante do crime, uma forma de pressionar o ex-presidente. A notícia foi relativizada no dia seguinte pelo próprio advogado numa entrevista na Globo News. Tratou de embaralhar os fatos, apresentando múltiplas versões. Bolsonaro apareceu na televisão numa entrevista ao Estado de São Paulo, resgatando a surrada imagem de cidadão comum, que toma um pingado no boteco e deixa cair pedaços de pão enquanto mastiga e fala ao mesmo tempo, mencionando de forma vaga que seu ajudante de ordens tinha autonomia para vender as joias que lhe pertenciam, segundo a legislação. Não podendo negar a venda do relógio, recomprado nos Estados Unidos pelo advogado e quebra galho Wassef, Bolsonaro refugiou-se na última fronteira encontrada pela defesa: questionar a regulação da propriedade dos presentes recebidos pela presidência. Nos bastidores, sabe-se que procura um acordo com o ex-ajudante de ordens que atenue sua pena (o reconhecimento de que cumpriu ordens). Ou seja, reconhecer o fato e tentar descaracterizar o crime.
A quebra de sigilo bancário do casal Bolsonaro, autorizada por Moraes, poderá trazer dados irrefutáveis sobre a movimentação financeira e eventuais ilícitos da dupla. O caminho da justiça é lento, mas eficaz, como se evidenciou na prisão da cúpula do comando da PM do Distrito Federal por envolvimento com a tentativa de golpe no 8 de janeiro. Aos poucos, o cerco vai se fechando, dados novos são revelados, confirmando a arquitetura do golpe e minando a aposta dos bolsonaristas de uma eventual acomodação da situação nos próximos anos, que prepararia o terreno para sua volta ao poder em 2026.
A casa não caiu ainda, como chegaram a anunciar os comentaristas mais afoitos, mas uma coisa é certa: “para o futuro da democracia no Brasil, será imprescindível e imperativa a condenação de Bolsonaro por ter planejado um golpe de Estado valendo-se da mentira, da manipulação de consciências e finalmente da abolição violenta do Estado de Direito, pois isso é que foi tentado em 8 de janeiro e nos eventos de dezembro”.
A semana que passou não foi muito boa também para o governo, embora os dados da última pesquisa Quaest tenham indicado que os índices de aprovação de Lula superaram os de reprovação entre evangélicos, os mais ricos e estados da região Sul. O apagão de energia gerou inegável desgaste e suas causas não foram devidamente explicadas. Embora setores do governo apontem problemas técnicos na rede, o próprio ministro de Minas e Energia não descartou a hipótese de sabotagem. Seja qual for a causa, o fato evidenciou a vulnerabilidade do sistema e acendeu o sinal amarelo para a gestão de um setor vital para a economia e para a sociedade.
Os comentários de Haddad sobre o desmesurado poder do Legislativo serviram e mote para Lira demonstrar descontentamento e cobrar novamente de Lula a reforma ministerial. Na manga, o trunfo de sempre: dificultar a aprovação de projetos de interesse do governo na Câmara. Além do novo marco fiscal e da reforma tributária, os deputados ainda não votaram a Lei de Diretrizes Orçamentárias que precede e orienta a montagem do próprio orçamento. O prazo para esta votação esgota-se em agosto. Mesmo assim, Lula adiou o anúncio das mudanças no ministério para depois da viagem à África do Sul onde participará de uma reunião da cúpula dos Bric’s.