Museus Capitolinos
Os Museus Capitolinos são um conjunto de palácios romanos que abrigam uma vasta coleção de obras de arte. Localizam-se no topo da colina do Capitólio, ou Monte Capitolino, uma das sete colinas sobre as quais a cidade de Roma foi erguida. Os museus ficam em torno da praça redesenhada por Michelangelo em 1536 e reconstruída ao Longo de 400 anos.
A coleção teve início com a doação do papa Sisto IV ao povo romano, em 1471, de estátuas de bronze conservadas na Basílica de São João de Latrão, que incluíam, entre outras obras famosas, a Loba romana, o Spinário e remanescentes da estátua colossal de Constantino. Mais do que mera doação, tratou-se de um gesto simbólico de devolver ao poder civil e colocar no Capitólio, sede da vida religiosa da Roma antiga e da magistratura civil na Idade Média, “relíquias que lembravam a todos a continuidade da grandeza de Roma, desde o tempo dos césares”. Tratou-se, pois, de uma restituição.
A partir desta época, o acervo dos museus passou por uma tortuosa história, ora enriquecido por novas doações e aquisições, ou sequestrado, como ocorreu no período da invasão napoleônica, no início do século XIX, e só devolvido depois de muita diligência diplomática, com a queda de Napoleão.
Conheci o museu em minhas andanças pelo centro histórico de Roma em 2003, cidade que visitara várias vezes na década anterior, geralmente a trabalho e com pouco tempo disponível para atividades culturais. Desta vez, tive a disponibilidade de alguns dias, cujo relato mais completo fica para outros momentos e espaços do Blog.
Nessas andanças, não costumo seguir um roteiro. Sigo a intuição, priorizo a descoberta e a sensação de me encantar com o resultado. Nada como dar-se o tempo de parar diante de uma imagem singular, uma cena do cotidiano circundada por construções históricas, reparar num detalhe, imaginar como foi criada uma estátua, gravado um alto relevo em mármore, pintada uma tela. Nada como deixar-se levar, por alguns instantes, pela beleza, aquela que é desvelada ali, com a emoção que bate primeiro no coração para, em seguida, deixar a imaginação voar, sem tempo certo para se chegar a uma leitura mais acurada, nunca definitiva. Só depois, pesquiso e leio a respeito do que vi e descobri, processo inverso ao da maioria dos turistas. Não consigo me imaginar com um guia turístico nas mãos, correndo atrás de locais, monumentos e obras de arte descritas pelo olhar de outro, por melhor que possa ser. Ainda mais em Roma, um verdadeiro museu a céu aberto, de acordo com a expressão que já virou lugar comum.
Subi primeiro a escadaria projetada por Michelangelo, ladeada por duas esculturas. Em cada uma, a mão do gênio renascentista, os movimentos do cinzel extraindo do mármore traços inconfundíveis de beleza clássica. Ali também está o mestre das formas e da simetria perfeitas, as linhas geométricas traçadas com precisão no chão da pequena praça, convergindo para o centro onde se ergue a estátua equestre de Marco Aurélio, na realidade uma réplica, pois o original está exposto num dos pátios do museu ao lado.
A primeira impressão, ao entrar na galeria do Palácio dos Senadores é de assombro e inquietação diante de tanta beleza reunida num único local. As esculturas ou o que restou delas, como a cabeça e uma das mãos do imperador Constantino, impactam pela dimensão monumental, mas também pelo semblante expressivo e o olhar que parece contemplar os séculos.
E o que dizer do majestoso Hércules, escultura em madeira coberta por lâminas de ouro, másculo e ao mesmo tempo severo, olhando-nos com inquietude e incerteza?
Nada mais tocante do que a escultura do Gaulês ferido, cuja vida se esvai aos poucos, momento final de agonia e anseio.
Que gesto mais prosaico, imortalizado na pequena imagem do garoto que tira um espinho do pé! Ficar, por demorados instantes, diante da imagem icônica da loba alimentando os gêmeos é voltar no tempo de heróis míticos, das lendas transformadas na história imortalizada pelos versos de Virgílio; é também se encantar com a perfeição da arte ancestral de reminiscência etrusca.
A enigmática escultura de Arthemis de Éfeso, de face e mãos negras e traços helênicos, coberta por camadas sobrepostas de seios, túnica de inequívoco apelo, chama a atenção por fundir Eros e Zoe, síntese complexa e misteriosa do poder feminino de eras e linhagens perdidas no tempo.
E por falar em linguagem dos símbolos, nada mais pretenciosa do que aquela da escultura do imperador Comodo, ao se apropriar dos signos de força e poder do lendário Hércules. Mesmo assim, a escultura não deixa de ser exuberantemente bela.
Por tudo isso e muito mais, a breve passagem pelos Museus Capitolinos permanece na memória como espaço onde a história e a beleza se encontram e se fundem, para o orgulho dos romanos e alegria dos turistas.