Semana de 17 a 24 de março/2024
Depois de Macron afirmar nos bastidores que a Ucrânia pode cair em breve e de Putin ter declarado que a Crimeia faz parte da nova Rússia, Kiev lançou no final da semana um ataque vigoroso contra o território anexado há mais de dez anos por Moscou. O exército russo retaliou, fazendo, pela terceira noite seguida, um grande bombardeio aéreo sobre a Ucrânia. Colocou a Polônia em alerta quando um dos mísseis russos violou seu espaço aéreo.
A rápida escalada ocorre uma semana após Putin se reeleger pela quinta vez presidente da Rússia, prometer vingança pelos ataques dos ucranianos à região de Belgorodo e de Moscou ter sido alvo de um brutal ato terrorista por parte do Estado Islâmico. Comenta-se a existência de um grupo informal e secreto para pensar um acordo de paz. Segundo informações vazadas na imprensa, o lado russo estaria disposto a aceitar uma proposta “em que a Ucrânia não ingressaria na aliança ocidental, mas em que as garantias de segurança para o governo de Zelenski estariam colocadas de outro modo. Elas viriam na forma de uma expansão do sistema de acordos militares bilaterais que Kiev tem assinado com alguns países europeus integrantes da OTAN”.
Mais uma resolução de cessar-fogo apresentada pelos Estados Unidos foi vetada no Conselho de Segurança da ONU, desta vez pela China e Rússia, por não assegurar as condições de uma trégua duradoura. A medida era parte da pressão mais forte do governo Biden sobre Israel, que vem ficando cada vez mais isolado no cenário internacional. Este foi o momento escolhido pelos governadores de São Paulo e de Goiás para visitar Israel e tirar foto ao lado de Netanyahu.
O caso Marielle tomou conta do cenário nacional no final da semana. O anúncio feito por Lewandowski, na terça-feira (19), de que Moraes havia homologado a delação premiada do ex-policial militar Ronnie Lessa, apontado por investigadores como o responsável pelos tiros que mataram a ex-vereadora, gerou enorme expectativa: “Esta colaboração, um meio de obtenção de provas, traz elementos importantíssimos que nos levam a crer que brevemente teremos a solução do assassinato de Marielle Franco. O processo segue em segredo de Justiça”, declarou o ministro da Justiça.
A prisão no domingo pela manhã do deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil-RJ), de seu irmão, o conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado) do Rio Domingos Brazão, e o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil no Rio, mostra que o desvelamento do crime se aproxima do desfecho, ao mesmo tempo em que sinaliza o “combo” ainda a ser plenamente esclarecido, envolvendo políticos, polícia e crime organizado no cenário fluminense.
De acordo com o relatório da PF, “o crime foi idealizado pelos dois irmãos e meticulosamente planejado por Rivaldo, então diretor da Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro. Ele teria aderido ao crime antes mesmo dos executores Edmilson Macalé e Ronnie Lessa, passando a ser um dos arquitetos do assassinato na companhia dos irmãos Brazão.” O inquérito da Polícia Federal indica que a vereadora Marielle foi assassinada “por ser vista como um obstáculo aos interesses” dos dois irmãos .
A nova prisão do tenente-coronel Mauro Cid, por ter descumprido medidas cautelares impostas no processo criminal em curso, reaviou o caso da frustrada trama golpista. O ex-ajudante de ordem afirmou em áudio que policiais federais o teriam pressionando a relatar fatos que não aconteceram. Em depoimento à PF, no entanto, Cid negou ter sido alvo de coação. Bolsonaristas chegaram a especular sobre a anulação da delação premiada, hipótese desmentida pelo judiciário. Mas o que incomodou, de fato, as hostes do ex-presidente foi a notícia que ele havia sido indiciado pela Polícia Federal por ter falsificado cartões de vacinação contra a Covid antes de viajar para os Estados Unidos. Foi acusado de dois crimes principais: inserção de dados falsos em sistema de informações e associação criminosa, podendo pegar até 15 anos de prisão.
A Câmara federal aprovou dois projetos importantes, o que proíbe as “saidinhas” de presos em determinadas épocas do ano, com o objetivo de ressocialização, medida considerada mais um retrocesso conservador; e o que faz ajustes no Novo Ensino Médio preservando o cerne do projeto original que setores importantes da sociedade gostariam de ver revogado. Foi avaliado positivamente pela mídia corporativa por ter mantido a flexibilização do currículo e a integração da educação profissional à regular, delimitando os itinerários formativos a cinco áreas de concentração de conteúdo. Articulado a outra medida do governo, o programa Pé de Meia, que oferece uma pequena vantagem financeira ao aluno que concluir o ensino médio, o projeto aprovado pelos deputados federais poderá conter a evasão escolar, um dos gargalos do sistema nesta etapa da educação básica. No entanto, parte importante da sociedade continua achando que a medida não passa de um remendo no ensino médio, que continuará oferecendo aos estudantes pobres uma formação geral e técnica precária.
Teve grande repercussão na mídia progressista e em setores da esquerda o artigo de José Dirceu sobre os desafios do governo Lula. Partindo da pergunta sobre as razões da queda de aprovação do governo, “se há sinais claros de melhoria na economia, no emprego, na recuperação dos programas sociais tão necessários e caros à população”, ele levanta questões importantes para as quais as respostas não são simples, reconhece. Vale a pena destacar algumas delas.
Segundo ele, “há uma percepção de que o governo está perdendo a batalha da narrativa e da comunicação”. Primeiro, por não fazer “a disputa diária frente ao noticiário da mídia corporativa para esclarecer seus pontos de vista e decisões.” Segundo, por não conseguir “furar o bloqueio das bolhas de extrema-direita das mídias sociais que continuam alimentando seus seguidores com uma realidade paralela de notícias falsas que vão de temas como família, saúde, vacina e aborto até questões de segurança pública e educação.”
Há problemas também de gestão do projeto político. “Áreas sensíveis para o eleitor – saúde e segurança pública, emprego e renda – precisam de acompanhamento e coordenação. Não se trata só de controle de execução, mas da expressão política das metas do governo e das ações para que sejam concretizadas no Parlamento e junto aos partidos aliados e à nossa base social.(…) No momento e ciclo político que vivemos – o desafio de uma aliança com a centro-direita, de um lado, e a oposição sem trégua da extrema-direita, de outro –, a articulação política ganha nova dimensão. E a capacidade de entrega do governo precisa ser fortalecida.”
Por fim, Dirceu aponta a necessidade de fortalecer a aliança com as forças políticas que deram a vitória a Lula. “Nesse cenário, nunca foram tão importantes a unidade do governo com sua base de apoio de centro-esquerda e a mobilização social para sustentar as mudanças necessárias para superar esses desafios reais e disputar a narrativa das razões que impedem o país de crescer e distribuir renda”, afirma.